A esquerda organizada e combativa é sempre atacada pela classe dominante joinvilense. Procuram acabar com as lutas operárias, estudantis, artísticas e comunitárias, seja pela repressão estatal ou de forças privadas. A tentativa de apagamento das lutas populares é outra maneira de exercer a repressão, como se resistir ao capitalismo e a todas as formas de opressões fosse coisa de “gente de fora”, já que Joinville é uma cidade “pacata”, “ordeira” e trabalhadora”, avessa às subversões. Infelizmente, a história das classes oprimidas e suas expressões de luta em Joinville, como o movimento operário, não recebeu ainda um estudo sistemático, somente pesquisas dispersas. Porém, é a partir desses trabalhos que apresentamos as linhas a seguir.
O ano de 2020 é um ano emblemático para questionarmos o apagamento promovido pelos ricos e poderosos da cidade do “Príncipe”. Há 100 anos a classe operária local demonstrou a sua relação orgânica com as manifestações e os anseios por vida digna da classe operária em todo o território do país, uma classe composta por trabalhadores e trabalhadoras brasileiras e imigrantes, sendo fundamental destacar a presença de trabalhadoras negras e negros na cidade, assim como nas lutas operárias por todo o país.
Nos primeiros anos do século XX, Joinville passava por um processo de industrialização, resultado de acumulação de riquezas por meio da exploração dos recursos naturais; observava a concentração de 50% da terra nas mãos de 5% da população; e convivia com os resquícios vivos da escravização da população negra anterior à formação da República, da expulsão dos povos indígenas para o interior e a exploração da mão de obra assalariada de negros, imigrantes, migrantes e nascidos na cidade (CUNHA, 2004; FERREIRA, 2019).
Segundo Iara Costa, a cidade foi se “transformando no maior centro industrial catarinense, e antes de 1920 já possuía mais de 43 estabelecimentos, o maior número de réis e mão de obra aplicado neste setor. No entanto, o modelo econômico brasileiro, via na indústria têxtil a inspiração do desenvolvimento, apoiado nas inter-relações binômicas do café-indústria.” (COSTA, 1996, p. 23)
E foi no processo do fazer capitalista da cidade, que a classe operária realizou a suas lutas. Entre os anos 1907 e 1911, com base em reportagens do jornal Gazeta de Joinville, organizou-se a Liga Operária e de Classes Anexas de Joinville, realizando eventos de sociabilidade, brechós, passeatas alusivas ao 1º de maio, a defesa da liberdade de imprensa e do socialismo.
Nos anos seguintes até 1920, na terra da “ordem”, diversas greves marcaram o cotidiano do espaço urbano que se formava. Em julho de 1917, a greve geral surgida em São Paulo se fez presente em Jonville com a adesão de ferroviários, mecânicos, pedreiros, carpinteiros, cervejeiros, operários de fábrica de fósforos, costureiras e padeiros. Evento que representa o quanto o movimento operário local estava por dentro dos levantes operários em diferentes capitais brasileiras.
No capítulo “Construindo a resistência urbana”, de sua dissertação, Iara Costa afirma que “[…] os salários foram reajustados somente 20%, mas que em troca foram prometidos uma cooperativa alimentar aos operários pelo preço de custo, diminuindo e barateando o custo de vida, e sugestões para ajudar na construção de algumas casas operárias nas imediações das fábricas, para diminuir os gastos com conduções” (COSTA, 1996, p. 153).
O fato é que as agitações operárias ecoaram as condições de vida dos mais pobres e também representaram para a classe dominante local o poder de organização e mobilização da classe operária urbana.
No ano de 1919, os jornais locais afirmam existir um tensionamento com possível início de uma greve por 8 horas de trabalho, aumento de 30% nos salários e um salário-mínimo para os trabalhadores auxiliares. A mesma imprensa dá indício que a movimentação paredista foi reprimida. Em Joinville, também marca o período a greve dos padeiros em 1920, reivindicando o direito ao descanso aos domingos.
No aspecto político, o movimento operário debatia a necessidade da solidariedade de classe e, no âmbito tático, debatia se deveria organizar a classe em torno da greve geral ou por categoria. Um debate fundamental do sindicalismo revolucionário mundial, que foi fortemente marcado pela atuação dos e das anarquistas, além da presença de outras correntes socialistas.
O segmento mais expressivo da “classe que tudo produz” estava organizado a Confederação Operária Brasileira, que havia realizado o 1º Congresso Operário Brasileiro em abril de 1906, no Rio de Janeiro. É nesse congresso que a organização firma o como estatuto um sindicalismo revolucionário por meio de sindicatos livres, a ação direta, a solidariedade de classe, o internacionalismo, federalismo, antimilitarismo e o que ficou conhecido por neutralidade sindical, ou seja, que a entidade não faria a filiação de trabalhadores por recorte político-ideológico, mas reuniria toda a classe². O meios de difusão da linha política da COB incluíam o jornal, a educação e o teatro. Em 1913, novamente na capital federal da época, foi realizado o segundo Congresso Operário Brasileiro, que reafirmou os encaminhamentos do primeiro congresso (MATEUS, 2013).
É frente ano contexto apresentado que, em 1920, a experiência do movimento operário joinvilense se encontra diretamente com as lutas do cenário nacional. Nas semanas anteriores ao 3º Congresso Operário, segundo Iara Costa, em Joinville realizou-se “uma sessão preliminar do Congresso Brasileiro de Operários, achando-se numerosos representantes de associações operárias, demonstrando que estes estavam engajados nos movimentos nacionais.” (COSTA, 1996, p. 157).
A capital federal foi palco do terceiro Congresso em abril de 1920 e, “defendeu a prioridade da sindicalização por indústrias, em ‘detrimento da organização por ofícios’, sendo que as decisões dos congressos anteriores são reafirmadas com certas questões particulares do próprio contexto. Essa resolução que aprovara a preferências pelos sindicatos de indústria em detrimento dos de comércio é bastante clara.” (MATEUS, 2013, p. 9) O evento ficou marcado por sua abordagem internacionalista, inclusive com apoio a aos revolucionários mexicanos, russos e um protesto contra ao assassinato de Rosa Luxemburgo.
As manifestações da rebeldia urbana no fazer-se enquanto classe tiveram continuidade com um chamado para greve geral. Os jornais burgueses locais, no mês de outubro, diziam que estavam envolvidos os “operários de calçados, marceneiros, trabalhadores da construção civil, metalúrgicos, maleiros, tapeceiros e os empregados em bares, cafés e o sindicato culinário” (COSTA, 1996, p. 157).
Em dezembro de 1920, os mesmos jornais apresentaram a reivindicação dos padeiros para terem um dia de folga por semana, conquistado por meio de uma lei municipal assinada pelo Conselho Municipal. Sendo assim, a noite de domingo para segunda-feira tornou-se o dia de folga.
As lutas por vida digna estiveram presentes no processo de formação social da cidade de Joinville, mesmo quando os governantes e os patrões utilizaram da imprensa burguesa da época, das forças repressivas estatais e das demissões para reprimir aqueles e aquelas que organizaram e resistiram. Demonstrações realizadas em nosso próprio solo que mostram que não existe dominação que não seja respondida com organização, luta e conquistas de nossa parte, as e os de baixo.
Notas
1. O artigo é parte o esforço do Coletivo Anarquista Bandeira Negra (CABN), integrante da Coordenação Anarquista Brasileira (CAB), em identificar as histórias e memórias das classes oprimidas, suas manifestações políticas de resistência e organização, assim como de sua cultura e arte. Sugerimos também a exposição “100 anos da Greve Geral de 1917” , o relato das atividades alusivas ao centenário da greve em 1917 e o livreto “Marcas Libertárias: episódios anarquistas em Santa Catarina (1848 – 2011)”, a ser publicado pelo CABN.
2. É recorrente na historiografia brasileira classificar a atuação anarquista junto ao movimento operário na Primeira República (1889–1930) como anarcos-sindicalismo. Ou seja, as organizações sindicais mantinham um estatuto e programa político de orientação anarquista para a sociedade futura, como foi hegemônico na Federação Operária Regional Argentina (FORA) e Federação Operária Regional Uruguai (FORU). No entanto, hegemonicamente, a atuação anarquista no movimento operário brasileiro, adotou princípios e programa em diálogo com o sindicalismo revolucionário nos moldes da Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) francesa.
COSTA, Iara Andrade. A cidade da ordem: tensões sociais e controle (Joinville 1917/1943). UFPR, Curitiba, 1996
CUNHA, Dilney F. Mito e realidade sobre a gênese e o desenvolvimento da cidade. Revista Ontem e hoje, março de 2004
FERREIRA, Luiz Matheus da Silva Ferreira. Terra, trabalho e indústria na Colônia de Imigrantes Dona Francisca (Joinville), Santa Catarina, 1850 – 1920). USP, 2019
MATEUS, João Gabriel da Fonseca. O sindicalismo revolucionário como estratégia dos Congressos Operários (1906, 1913, 1920). Instituto de Teoria e História do Anarquismo, 2013. Consultado no dia 14 de junho de 2020.
Lex Pierrot
29/06/2020
PALHAÇADA
Joinville tem uma cultura própria e enraizada das questões operárias. Mas aí surgem os pseudo anarquistas no local, vindos do nada, e começam seu trabalho sujo.
Agora vão querer, sorrateiramente, se colocarem como herdeiros da COB, tentando assim alcançarem algum tipo de legitimidade em sua farsa.
Vêm com um blábláblá teórico supostamente socialista, de viés marxista, pré fabricado, que só demonstra o quanto estão desconectados da realidade local.
Sem contar os erros históricos.
Tenta colocar as lutas locais como reflexos de lutas de São Paulo, demonstrando que seguem as mentiras escritas por acadêmicos marxistas sobre as lutas sociais no Brasil.
Mentiras que interessam à CUT e sua inócua luta infinita por porcentagens de aumento salarial, tese derrubada na Primeira Internacional, em debate que o phD Marx perdeu para um alfaiate, mas retomada na Segunda Internacional, que retirou das lutas operárias toda sua importância e capacidade de transformação social.
Dissecam com bisturi a história dos operários brasileiros para montar um Frankenstein que justifique suas presepadas atuais.
A população local provavelmente os verá com maus olhos.
Uma propaganda negativa para a Anarquia, e também para a COB.